Texto recuperado de 5/Nov/2018
A minha cabeça ganhou o poder de se abstrair do trabalho e da vida lá fora. Hoje, ponho os headphones, ligo o computador e viajo em qualquer coisa. Navego por lugares desconhecidos e penso, penso no passado, no presente e muitas vezes no futuro.
A minha cabeça ganhou muitos poderes. Poderes ligados ao coração.
Sete anos que fizeram de mim uma mulher muito diferente.
Há sete anos eu era uma mãe normal com uma filha linda e chorona acabada de nascer e com outra filha, linda, em casa, ansiosa, com o pai, para conhecer irmã.
Há seis anos eu continuei a ser uma mãe normal com duas filhas saudáveis, felizes e lindas, a imaginar um futuro promissor, lindo, diferente, com viagens e muitas aventuras!
Há cinco anos eu continuei a ser uma mãe normal com duas filhas saudáveis, felizes e lindas, mas agora mais resistente para as birras e noites mal dormidas. Os sonhos continuavam….
Há quatro anos, lá me mantive como mãe normal de duas filhas saudáveis, felizes e lindas, e com o poder de aguentar birras da mais nova e de me deliciar com a calma e sensatez da mais velha. Tudo equilibrado!
Há três anos eu era um tipo de mãe normal com duas filhas saudáveis e felizes com a mais nova a dar muitas dores de cabeça.
Como mãe normal que era, teria que a bem educar e vários foram os momentos que a minha paciência chegou ao limite. Os momentos de pausa só funcionavam às vezes….
Há dois anos e meio eu era uma mãe esgotada, com duas filhas lindas e com um problema diagnosticado: a epilepsia da mais nova. Passado o susto, o choque e o medo, a vida continuou.
Fui durante dois anos uma mãe confusa. A epilepsia não era normal…. a Margarida começou a “desaprender” tudo e a falar cada vez menos.
Se por um lado tinha que me manter firme a levar tudo com naturalidade e bom senso, por outro lado, parecia que nada funcionava. O desespero instalou-se.
Neste momento eu era uma mãe que chorava. Chorava porque gritava, chorava porque me irritava, chorava porque os berros me doíam na alma, chorava porque não sabia o que se estava a passar e não sabia como agir.
De repente eu era uma mãe de duas filhas lindas, mas uma mãe confusa, desesperada à espera de respostas médicas que demoravam a vir…
Até que há 1 ano dois meses e cinco dias, a 20 de Abril de 2018, chega a noticia que nenhum pai deveria ter e aí tornei-me mãe de duas filhas lindas e felizes, uma saudável e outra saudável na sua doença, a Tay-Sachs.
Tornei-me numa mãe tranquila, só com mimos para dar, numa mãe que fica mais 10 minutos na cama com as filhas porque amanhã não vai ter estes abraços, numa mãe pronta para ir à luta, numa mulher que tem de arriscar e que tem de viver experiências com as filhas, porque amanhã não seremos 4, amanhã seremos 3.
É hoje que temos de ser felizes, ponderados e equilibrados para fazermos as nossas filhas felizes.
Hoje a Margarida e a Tay-Sachs fazem sete anos em minha casa.
Hoje percebo que no meio de tanta coisa má a Margarida, vs Tay-sachs, trouxeram-nos muitas coisas boas:
– Mostraram-nos que a tolerância é uma arma essencial na nossa vida;
– Fizeram-nos olhar para a vida de outra forma;
– Graças a elas já conhecemos verdadeiros Super Heróis;
– Ficámos a conhecer a nossa força vinda… não sei de onde;
– Fizeram-nos acreditar sempre no amor;
– A nossa família cresceu, agora estende-se aos amigos especiais, a médicos, a terapeutas e clientes, que decidiram fazer parte da nossa caminhada;
– Ficámos a saber que se não arrumarmos a cozinha hoje porque nos apetece ficar nos mimos no sofá, nada de mal acontece;
– Confirmámos que um abraço pode mesmo curar muita coisa;
– E principalmente percebemos que se usamos os óculos cor de rosa, sempre, a vida é muito melhor. Porque andar triste e a bater com a cabeça nas paredes não leva a nada.
O que poderia parecer um cliché há sete anos atrás, é agora a nossa forma de viver a vida.
Parabéns Margarida, pai Zé e mana Madalena! O meu amor por vocês é infinito!