Provavelmente nunca ouviram falar de Tay-Sachs, e ainda bem!

A Tay-Sachs é uma doença que surge na idade infantil e, quando aparece, a família da criança doente fica destroçada, por vezes sem capacidade de reação.

 “A doença de Tay Sachs (DTS) é uma gangliosidose em que ocorre a acumulação do gangliosídio GM2 especialmente nos neurónios. Essa acumulação deve-se a um defeito na enzima hexosaminidase A decorrente de mutações no seu gene codificador. É uma doença neurodegenerativa.”

Trocando isto por miúdos, a Tay-sachs é uma doença neurodegenerativa rara, sem cura e fatal. Os neurónios das crianças com Tay-Sachs, por não terem enzimas suficientes para limpar o “lixo” que se vai criando, vão morrendo.

Para nós, pais da Margarida, o diagnóstico só chegou a 20 de abril de 2018, dois anos depois dos primeiros sintomas e após um percurso marcado por diagnósticos errados e vários tratamentos.

A Margarida nasceu a 15 de junho de 2012.

Era uma miúda saudável e terrorista que cresceu e se tornou uma cantora nata! Faladora e com um sentido de humor raro, a Margarida divertia quem estivesse à sua volta.

Apesar de também chorona e rabugenta, a Margarida sempre se mostrou carinhosa e dócil, feitio que mantém apesar de todas as vicissitudes da sua curta vida.

Quase a chegar aos 4 anos, a M começou a ter dificuldades na fala, situação normal em muitos miúdos mas que nos levou a nós, pais, a pedir uma avaliação por um terapeuta.

No entanto, antes da avaliação, a M teve uma crise epiléptica.

Realizados os exames necessários, foi-lhe diagnosticada epilepsia.

Apesar de abalados com a notícia, pensámos:  “Bom! É só epilepsia. Desde que seja controlada a vida continua.”

E assim foi.

A vida continuou… mas as crises também.

Foram feitos mais exames, alterou-se a medicação e tudo seguiu normalmente.

Entretanto… algo de errado se passava com a M a nível cognitivo e motor.

Seguiram-se, então, novos tratamentos, desta feita à base de cortisona, uma experiência horrível.

Agora o diagnóstico era outro: “ A sua filha parece ter Síndrome de Landau Kleffner”.

Estudámos tudo o que havia para estudar sobre o síndrome, entrámos em grupos de FaceBook onde os pais trocavam ideias, partilhámos com eles a nossa história, traduzimos flyers para distribuir entre amigos e família, mas, passado algum tempo, recebemos a notícia: “Parece que nos estamos a afastar da possibilidade de Landau Kleffner”.

Estávamos então perante uma encefalopatia epilética e tudo poderia melhorar com as terapias.

No entanto, entre Dezembro de 2017 e Janeiro de 2018, a Margarida começou a falar menos, a não dizer a última sílaba, a não conseguir acompanhar o António Zambujo na sua música preferida, o “Pica do 7”, que até aí sabia de cor.

Puxámos por ela! A música portuguesa começou a ser uma constante em casa, mas, progressivamente, foi-se tornando clara a deterioração das capacidades da Margarida: perdeu a capacidade de falar; começou a denotar dificuldades motoras que a impediam de dançar como até aí e a levavam a cair; comer sozinha tornou-se de dia para dia mais complicado; pegar no copo passou a ser uma tarefa de equilibrismo…

Algo se passava.

E foi quando entrámos em contacto com o Dr António Levy, Chefe de serviço de Pediatria e coordenador da Unidade de Neurologia Pediátrica do Departamento de Pediatria do Hospital de Santa Maria/CHLN, com o Dr Tiago Proença, neuropediatra no Hospital de Santa Maria/CHLN, e restante equipa. “A Margarida foi pouco estudada, temos que fazer mais exames”, disseram-nos com ar de preocupação.

Foi então que, a 20 de Abril de 2018, realizados novos exames, a notícia do diagnóstico da doença da Margarida nos caiu em cima dos ombros.

Naquele momento a nossa vida desfez-se. Tudo o que tínhamos planeado acabou. Era tão bom que a Margarida tivesse apenas uma epilepsia…

Conseguimos reagir e passadas duas semanas estávamos em Madrid para participar na “European Tay-Sachs and Sandhoff Family Conference”, o que se revelou a melhor opção que tomámos. 

Em Madrid, no contacto com as famílias de outras crianças doentes, conhecemos pais fantásticos, únicos, com uma força extraordinária que parecia roubada a super-heróis, e que nos levou a querer ser como eles.

Mantemos contacto com duas associações europeias: a CATS foundation, na Inglaterra, criada por uma portuguesa, a Patrícia, que teve uma menina com Tay-Sachs; e a ACTAYS, em Espanha, criada pela Beatriz Fernandez, também ela mãe de uma menina com a mesma doença.

Duas famílias que, embora não tenham conseguido salvar as suas filhas, dedicam o seu tempo a tentar salvar os filhos dos outros.

Actualmente, na busca de um tratamento para esta doença, e por essa tarefa se tornar quase impossível dados os poucos casos diagnosticados em Portugal – apenas quatro que nós saibamos – , o nosso objectivo é encontrar mais famílias em Portugal com crianças doentes.

Por a Tay-Sachs ser uma doença de diagnóstico difícil, acreditamos que em Portugal existem mais crianças doentes, ainda não diagnosticadas. 

Queremos que as crianças atingidas pela doença de Tay-Sachs sejam diagnosticadas precocemente e, assim, evitem um percurso por diagnósticos errados e tratamentos desadequados.

Queremos que a história da Margarida, mas também a da Carolina, da Fabiana e do Francisco, as outras três crianças, que conhecemos, diagnosticadas em Portugal, ajudem crianças e outros pais a trilhar o seu caminho aquando do diagnóstico.

Por estarmos conscientes que o investimento na investigação de uma cura para a doença de Tay-Sachs está dependente da maior divulgação da doença, lançamos aqui um apelo para que partilhem a nossa história.

Obrigada,

Inês e Zé